Há algumas semanas, viajei para San Francisco, USA, para participar do Intel Developers Forum, apresentando o Moblin. Era a primeira viagem desde a minha transferência, e muitos colegas que não via há algum tempo queriam saber como eu estava me adaptando. Em poucos dias, eu já estava com saudades de casa, e pela primeira vez casa realmente significava Londres. Dizem que você precisa passar seis meses em algum lugar para oficialmente se ambientar, e eu estou caminhando para meu sexto mês, então acho que estou quase lá.
Minha maior saudade quando estava fora claro era meu apartamento, minha cama, meu travesseiro, minhas coisas. Depois de tanto trabalho para deixar tudo do jeito que eu queria (cancerianos, argh…) – desde procurar quem montasse o guarda-roupa comprado peça por peça na IKEA, pintar e montar os pés da mesa do computador e levantar sozinha o tampo de vidro de 32kg, até os adesivos de flores na parede – natural que eu queira aproveitar. Mas, me acostumei com muitas outras coisas aqui também.
Acho que o fato mais prático é a sensação de segurança. Claro, como qualquer outra cidade, Londres tem seus crimes e assaltos, mas é infinitamente diferente de São Paulo, onde eu dirigia sempre olhando no retrovisor, morria de medo quando voltava para casa muito tarde ou de madrugada, evitava usar celular na rua e não assistia mais noticiário para não ficar paranóica. Só isto já vale a viagem. Tenho que parar agora de ver notícias do Brasil tão frequentemente, porque toda vez que leio fico deprimida pelos amigos e família, mas também feliz por ter saído. Aqui, mesmo os bairros considerados perigosos como Brixton não são assim tão perigosos, três dos desenvolvedores no trabalho moram lá e dizem que não é assim tão ruim.
Porém uma das coisas que eu mais gosto é o fato de que qualquer dia, em qualquer lugar, você vai ouvir pelo menos meia dúzia de idiomas diferentes: francês, japonês, alemão, outros que não reconheço e claro, portugues. Não passa um dia em que eu não ouça brasileiros nesta cidade. Desde tias peruas se achando o máximo tirando foto no Big Ben a amigos conversando no onibus. Minha nova personal na academia é brasileira, assim como outro treinador e uma recepcionista. Ainda assim, aqui no escritório, com pouco mais de 20 pessoas, diria que menos da metade são ingleses. Mulheres de sari e até de burka são comuns, lado a lado com micro-saias no metro. O povo da universidade lá de Sao Bernardo deveria passear um pouco por aí…
Levei duas semanas para entender o que as pessoas falavam. Ainda tenho que me concentrar quando algum escocês fala. Mas atualmente já consigo seguir as piadas dos programas de televisão, tanto pelo sotaque quanto pelos acontecimentos da semana. Tirar sarro do primeiro ministro está sempre na agenda destes programas. O humor aqui é bem diferente, ácido, sarcástico, beirando – e as vezes ultrapassando – os limites da indignação. Este fim de semana também comprei e assisti o The Office original, com Ricky Gervais, antes só havia visto o americano, com Steve Carrel. A diferença entre os dois programas reflete bem o tipo de humor britânico. E enquanto o personagem do seriado americano as vezes dá até pena, eu nunca havia odiado tanto um personagem quanto o gerente na versão inglesa. Juro, quando ele entrava em cena eu queria esganá-lo. Por coincidência a noite estava passando na TV um stand-up dele, onde eu não acreditava no que estava ouvindo. Não é a putaria ou apelação que a gente vê no programa do Gugu ou Zorra Total, mas dá pra ficar chocado. Ou não 🙂 Outros que eu gostei e estão disponíveis no Youtube foram Phill Jupitus falando sobre um louco que entrou na área dos leões no zoo de Londres e sobre aracnophobia.
A comida aqui é o que o povo que vem de fora mais reclama – e o que os ingleses mais gostam quando viajam para fora do país deles. Porém não é impossível ter uma boa alimentação – você precisa ou ganhar muito, mais muito bem, ou saber cozinhar. Eu almoço fora de 3 a 4 vezes por semana, o resto eu faço em casa. Almoço de dia normal é sanduíche, comprado na esquina em alguma loja de fast food e comido na cozinha do escritório com toda a galera – o que também é outro exercício para mim, é como acompanhar as piadas internas do seriado Friends sem ter visto as temporadas anteriores. Alguns trazem comida de casa – muita sopa enlatada – ah, e aqui também é muito mais fácil encontrar comida vegetariana variada. Porém o que eu mais sinto falta é de um bom sushi… só encontrei sushi fast-food e restaurantes na faixa de 100 libras por pessoa – com este preço eu vou fazer um curso de sushi né…
Este mês finalmente comecei a ir pra balada. É engraçado estar em um ambiente onde a grande maioria das pessoas não sabe dançar. As inglesas querem ser sensuais, mas o resultado digamos, não é o esperado. As polacas dançando como robozinhos, me lembra as amigas de colégio que vinham de Pomerode ou alguma cidade assim, que nunca tinham ido a uma festa e se empolgavam. As brasileiras dançam fazendo biquinho. Enfim, pra mim é divertido ficar observando, mas o que eu ainda não entendo é porque os homens que saem pra caçar ainda não entenderam que os poucos que aprendem a dançar tem suas chances multiplicadas por 10.
Quando cheguei estava começando o verão, e tivemos muitos dias de sol e céu azul. Alguns poucos dias a temperatura chegou a 30 graus! Me disseram que foi bom eu ter chegado naquela época para me ambientar, quem chega no inverno fica deprimido de cara. O inverno mal está começando, e a temperatura média já está na casa dos 10 graus. Hoje mesmo é um dia pelos quais Londres é conhecida, cinza, frio, chuvoso – porém a chuva aqui é mais parecida a garoa de São Paulo que uma chuva propriamente. Tivemos um dia igual a este algumas semanas atrás, e uma mulher do escritório comentou comigo que nestes dias a taxa de suicídio deve ter subido imediatamente. Ainda não me afeta, mas pra muita gente é insuportável. Eu acho que este tipo de tempo apenas amplifica os sentimentos daqueles que querem voltar ao lugar de origem ou algum lugar mais simples. Eu por enquanto não planejo ir a nenhum lugar tão cedo, só se for para passear…
Pois, eu logo pensei que tu iria se dar super mal depois de ter saído dessa terra “linda, maravilhosa e tudo de bom” 😛
Ironias à parte, ao contrário do que todo mundo diz, sair do país não mata nem desintegra ninguém, e uma pessoa como tu, com o teu perfil era certo que iria se adaptar, por mais dificuldades que se enfrentem.
Parabéns!
bjos.