Matéria no Correio Braziliense – Aposta no software livre

Reproduzo aqui a matéria publicada na sessão de tecnologia do Correio Braziliense. Fiquei surpresa e imensamente honrada de ter o depoimento da minha primeira chefa e guru Kathia Juca, e da diretora de publicações da SBC, Karin Breitman. Muito obrigada!

Sulamita Garcia, engenheira de marketing técnico de um gigante do mercado, é a última personagem da série sobre mulheres na área da tecnologia da informação. A catarinense direcionou a carreira para o ramo dos programas de código aberto

» Thais de Luna

“No meu último ano do Ensino Médio, entrei em contato com computadores em um escritório onde trabalhei. Fiquei curiosa para mexer com essas máquinas e decidi tentar ciências da computação na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para descobrir mais sobre elas.” Assim começou a trajetória de Sulamita Garcia, uma catarinense de 34 anos, no universo da tecnologia.

Ela não imaginava que sua curiosidade a levaria a ser, um dia, engenheira de marketing técnico para a Europa do programa de desenvolvimento AppUp, da Intel – uma das maiores multinacionais do setor tecnológico. A jovem de cabelos vermelhos acertou na decisão do curso e começou a buscar descobrir qual especialização mais lhe interessava. “Trabalhei com desenvolvimento de sistemas, segurança, suporte e, mais recentemente, com marketing técnico, que é a divulgação de material técnico para outros profissionais”, detalha Sulamita. Ela considera a área em que atua hoje em dia muito interessante, pois “sempre aprende coisas novas” e tem “novos desafios”, o que acaba com a sensação de rotina.

Sulamita começou na Intel em 2007, como administradora de comunidades open source – referentes a softwares livres (também conhecidos como programas de código aberto). Empolgada, decidiu acrescentar à função o trabalho com outras empresas e o desenvolvimento de estratégias para novos produtos, soluções de problemas inovadoras e ações de marketing alternativas. “Foi uma fase extremamente enriquecedora para minha carreira, na qual aprendi muito sobre estratégia e desenvolvimento de negócios, deixando um pouco de lado a área técnica”, afirma. Além disso, ela considera que era muito gratificante atuar com a comunidade de código aberto de maneira integral, algo que, antes de ir para a companhia, fazia apenas no tempo livre.

Em 2009, surgiu a oportunidade de ser engenheira de marketing técnico de open source na Europa, mais especificamente em Londres, na Inglaterra. “O perfil específico para esse tipo de trabalho é de alguém com experiência técnica, mas que também mantenha relacionamento com clientes. Abracei a oportunidade”, relata. Para ela, foram dois anos que lhe acrescentaram muito profissionalmente, pois pôde trabalhar com equipes de nações distintas. “Em seguida, veio mais uma oportunidade de mudança, para atuar em Munique (Alemanha) com o programa Intel AppUp para Desenvolvedores, em que educamos desenvolvedores de aplicativos sobre as oportunidades criadas pela AppUp Store e os ajudamos a enviar suas criações”, esmiúça.

Por iniciativa própria, Sulamita tem estudado a influência da parte psicológica dos indivíduos na área de design, consumo e decisões. “A companhia tem grupos de análise da experiência do usuário, novos métodos de pesquisa de mercado e design, setores que são fascinantes para mim”, admite. Como o programa que comanda é voltado diretamente para consumidores e desenvolvedores, a catarinense acredita que essa percepção é importante para desenvolver produtos atrativos e fáceis de usar, que contem com o engajamento dos usuários.

Perseverante

Segundo a superintendente de governança eletrônica e tecnologia da informação e comunicação Kathia Regina Lemos Juca, professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e quem orientou Sulamita no trabalho de conclusão de curso, a ex-aluna conseguiu contribuir com a sociedade a partir da divulgação e da desmistificação do uso do sistema operacional Linux. Durante todos os anos em que conviveram, as características da personalidade da catarinense que mais chamaram a atenção da professora foram a perseverança e a postura ética da pupila. “No decorrer da graduação, ela enfrentou muitas dificuldades e percalços, devido a problemas financeiros, mas ela aceitava e enfrentava os desafios. Manteve-se durante toda a graduação com bolsas de apoio ou de pesquisa oferecidas pela instituição e nunca se deixou abater, sempre bela e muito positiva”, assegura.

Ela recorda que a jovem, que já se interessava por Linux e código aberto, teve mais influência para entender essas questões na faculdade. “Como sempre tivemos um numero razoável de equipamentos, ficava muito caro pagar a licença de softwares. Então, sempre foi incentivado o uso de open source em nossos servidores e em aplicações para a internet”, detalha. Kathia afirma que a presença de representantes mulheres em grandes companhias de tecnologia podem influenciar de maneira positiva aspirantes ao curso de ciências da computação.

Exemplo

A diretora de publicações da Sociedade Brasileira de Computação, Karin Breitman, professora do Departamento de Informática da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), conta que Sulamita é um exemplo para outras mulheres, principalmente no Brasil, de que é possível ter uma carreira bem-sucedida no mundo da computação. “Apesar de essa ser uma indústria de pessoas, em que se fala da importância do Bill Gates e do Steve Jobs, pouco se aborda sobre as contribuições pessoais técnicas, de engenheiros de verdade. A Sulamita é uma dessas pessoas que têm sucesso muito grande no mundo corporativo”, conta Karin.

Segundo a integrante da SBC, há um crescimento no número de vagas em empresas de tecnologia, mas muitas garotas nem sequer ingressam nos cursos de computação. “A gente tem mais ou menos três ou quatro ofertas de emprego por aluno”, reporta. Ela diz que, para convencer garotas a seguir o interesse que têm por computadores, usa casos como o da brasileira da Intel, como forma de apresentar possibilidades de emprego para essas jovens. “É fundamental mostrar o que fazem pessoas nessa área, abrangendo programação, design, arquitetura de software.”

Para Karin, o preconceito em ingressar na área não é apenas dos homens, mas das próprias mulheres. “Elas acham que vão ficar masculinizadas, com estigma de nerd. E então vem o exemplo da Sulamita, que tem uma boa carreira e ainda assim se arruma, é menininha, fala bem”, destaca. “Eu a acho sensacional. Ela tem um aspecto técnico muito forte, principalmente porque trabalha com Linux. E ela consegue mostrar que continua sendo feminina, mesmo em um emprego dominado por homens.” É essa diversidade de gêneros e culturas na indústria que, de acordo com Karin, faz o mercado evoluir.

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